sexta-feira, 31 de julho de 2015

Fugindo dos ogros


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Capítulo 7: Limpando a casa

Bem, começo esse capítulo para fazer entender uma coisa muito importante: não existe nada disso de Mané narrador no meu texto. Aqui quem fala é o ser demiurgo que bolou toda essa joça. Então, não venha dizer que eu morri, pois estou bem vivinha e da Silva que é parte do meu sobrenome. Portanto, as criaturas que eu criei serão vítimas da minha opinião e intromissão contumaz e dito isto, vamos aos acontecimentos psicológicos!

Amanda acabou por entender que para encontrar uma pessoa saudável, ela também precisava tornar-se saudável. Portanto, desistiu da busca desenfreada pela alma gêmea e decidiu dar um jeito na casa, ou seja, tratar as mazelas que a atormentavam para parar de ficar obcecada pelo encontro com o outro. Assim, percebeu que não era obrigatório dela de qualquer maneira. E se isso ocorresse ela não poderia mais se fragmentar sem volta!

Há pessoas e pessoas e, nesse caso, algumas como os amigos da Amanda são descolados e isso significa dizer que levam a vida numa boa. Outros, como Amanda, são obcecados, cada mínimo detalhe é importante, cada próximo passo, como se um passo em falso todo o processo se perdesse. São pessoas, profundamente, angustiadas que parecem, a todo momento, estar pedindo ajuda, estar buscando que o outro cure a grande inflamação que é a vida dessa pessoa.

Porque é isso mesmo, uma grande inflamação, sempre a dor e a angústia como se com um mínimo assopro fossem quebrar e sem conserto. No fundo, torna-se uma pessoa patética, mendigando por qualquer migalha de amor. Como se o mundo mau devesse algo a protagonista. Sempre procurando por segurança e nunca encontrando. E por toda essa constituição estrutural sentia-se um nada que precisa da alteridade para ser.

Amanda estava triste porque dentro do seu ser sentia que era impossível ser amada, tinha algumas ilhas de segurança quando percebia que um ou outro gostava dela, mas para ela isso era tão raro. E, por isso, foi muito angustiante descobrir que estava fantasiando que o seu vizinho gostava dela. No fundo de sua cabeça pensava que nunca ninguém gostou dela de verdade, nem aquele que, supostamente, não curtia a vida.

Obviamente, a protagonista estava firmada em esquemas estanques de comportamento, definido pelo senso comum e que via a vida como uma fórmula mágica. Como um exemplo bem banal e conhecido: se alguém não gosta de você é só sair com alguém lindo, com dinheiro e inteligente para provocar um ciúme de tal forma avassaladora que o objeto de desejo irá excomungar a quinta geração por não ter dado atenção aquela criatura tão magnífica que consegue chamar atenção de um partido tão bom quanto esse que está saindo. Tem pessoas que, realmente, pensam que se o relacionamento não for igualzinho aquele que a telenovela mostra, então, estão vivendo numa grande farsa.

Havia, assim, um esquema na cabeça da protagonista desde que conheceu o universo dos romances, via folhetim televisivo. O esquema era: ela vai ao local da paquera bem arrumada, um lindo homem a vê, naquela multidão de pessoas, se usar óculos, então, ainda fica mais difícil. Encaminha-se em sua direção, se apresenta e a convida para sair. Um ano e meio depois, mais ou menos, ela vai dar aquela festa de princesa que sempre sonhou, com seu lindo vestido branco para “causar” nos 800 amigos do facebook e receber o carinho de todos com o: “agora assim você é feliz, realizou o que todo mundo acha que deve ser”. Só faltam as letrinhas: The End em inglês ou O fim, em Português.

A vida nunca correspondeu ao esquema, ninguém nunca a tirou para dançar. Na adolescência enquanto todos tinham namoradinhos, ela estava, sempre, sozinha. Sem dúvida ouvia o quanto era bonita, inteligente, superdivertida, mas por dentro, fora do olhar do outro, sentia-se sem atrativos, estabanada e burra! Burra sim, uma pessoa inteligente conseguia conquistar. Os rapazes só se aproximavam dela para saber da amiga. Sempre se interessavam pelas amigas, nunca por ela. Seu primeiro namorado foi aos 19 anos, Ogro criado no mais puro boteco da esquina e cheirando a cerveja e cigarro, ele a tratava como lixo, nunca aparecia e nunca deixava ela terminar. Quando começou a namorar o ex-marido, em sua cabeça ouvia que se não ficasse com aquele, ninguém mais iria gostar dela. Ou ficaria com o ogro-mor ou sozinha pelo resto da vida e o medo da solidão trazia-lhe pânico.

Agora, todas essas lembranças a invadiam, nunca tinha falado de como via essa situação para ninguém e fez uma reunião de descarrego, no caso, abrir o verbo e falar o quanto se sentia mal com tudo e o quanto toda aquela alegria que ela demonstrava era falsa, sentia-se, profundamente, vazia.

Marina ficou chocada com o desabafo, sendo psicóloga nunca poderia imaginar que os sentimentos da amiga eram tão contundentes, afinal, ela era, extremamente, funcional e uma pessoa de sucesso. Claro, no olhar do outro, no olhar da protagonista, tudo era uma farsa e muito pesado de manter.

Rodrigo estava nessa sessão de desabafo e, também ficou surpreendido. E sabia que a nova amiga era sim desejável, ele a desejava, só que ela nunca conseguiu perceber quando alguém legal a queria. Ele nunca disse nada, não por ser tímido, nerd, apenas, porque ele conhecia a amiga e vizinha, se ele entrasse nesse relacionamento... Daqui a duas semanas, ela já estava comprando a passagem para passar a lua-de-mel em Paris. Ele nunca pensou em casar, gostava da vida de solteiro e, também, não iria iludir outro ser humano com promessas que não tinha intenção nenhuma de cumprir. Sabia que se decidisse ter um relacionamento com Amanda teria uma companheira maravilhosa, só que, também, pegajosa e carente e isso assusta, os maduros privilegiam a autonomia.

Só que o desabafo da protagonista mexeu com as estruturas sóbrias do vizinho e ele ficou doido para cuidar dela, principalmente, depois da convulsão de choros. Ela estava profundamente sexy e desamparada. Ficou assustado com o seu desejo e agora? Será que Rodrigo vai conquistar a vizinha? No próximo mês!
Margareth Sales

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