sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Lançamento Oficial e Apresentação do romance Identidades Roubadas



  
        Diferente dos artistas que aqui se apresentam, não sou poeta ou poetisa. A minha escrita é a prosa. Segundo Otávio Paz:

A prosa, que é primordialmente um instrumento de crítica e análise, exige uma lenta maturação e só se produz após uma longa série de esforços tendentes a dominar a fala. Seu avanço se mede pelo grau de domínio do pensamento sobre as palavras.

            No entanto, toda a linguagem literária é uma linguagem artística e a arte rompe com o senso comum. Senso comum é aquela forma de pensamento que só repete e perpetua o já dito. Portanto, a arte diz diferente, desconstrói a pseudo-normalidade trabalhando nas margens ou com as margens. Ou seja, tudo o que se situa fora do centro. Fora da dita normalidade, inexistente.
Vivemos em um momento de ruptura dessas ditas “normalidades”. Momento que se trabalha com a diferença e onde o foco é o diferente. E é nesse momento histórico que se encaixa o meu novo romance, sendo lançado, oficialmente, nesse espaço. Um romance que desconstrói a figura mítica da maternidade. Não para apregoar a inexistência de mães boas, mas tal qual Winnicott mostrar o contraponto: a mãe ruim, doente, que não escolheu ser mãe e que não assume bem esse papel.
            E só podemos conhecer essa mãe, por meio do protagonista do romance, seu filho: José! Através de José que se lança um holofote sobre a perversidade materna, veículo condutor de uma violência doméstica que despersonaliza o filho, roubando-lhe a identidade. Segundo Lya Luft: “Nem toda mulher nasce para ser mãe, e nem toda mãe é mártir. Muitas são algozes aliás”. Na página 7:

Nasceu macho. Essa foi a única alegria que deu a sua mãe. Seu nome era José, como o da Bíblia, pois sua mãe era uma católica fervorosa, dessa forma se auto-denominava. Por isso, abominava ter sido tocada pelo marido e desse fruto gerado um filho. Mesmo assim, orgulhava-se de dizer aos vizinhos que o filho era homem. Não se aproximava da criança, a não ser para cumprir o seu papel de mãe devota, mas não o cumpria tão bem assim... E tinha a si mesmo em alta conta por ser tão resignada com o que o destino mal lhe reservara.

            Por não ter ancorado a identidade do filho, o criou perdido, buscando, desesperadamente, o amor dessa mãe. Como se o problema da falta de amor estivesse na criança inocente?! Na página 29: “José voltou para casa, quebrado, mas lutando contra isso, tentando lembrar que conseguiu muitas mulheres e com raiva da maldade delas. E profundamente humilhado por voltar à casa da mãe”.
            Diante disso, nem sempre o retorno ao lar é a salvação, às vezes, a fuga é a solução mais saudável. Uma figura ferida em sua mais tenra infância e que tenta se reconstruir ou construir? Porque na página 85:

Punido, rechaçado, humilhado eram as únicas certezas de personalidade que o protagonista possuía. Muitas vezes pensava sobre si mesmo e imaginava quem era fora desses sentimentos. Nem no seu melhor relacionamento, se sentiu de verdade, somente tentava-se agarrar com todas as forças.

Buscando nessas outras mulheres o preenchimento do vazio qua a primeira mulher de sua vida lhe tinha imputado, viveu só fantasias e ilusões, não pode ou não conseguiu construir de verdade.
            Andava assim no meio das chamas e do inferno. A pergunta que faço para aqueles que, ainda, não tiveram a experiência de mergulhar nessas páginas é se na página 88: “Havia uma construção de desamparo e tragédia fortíssima em sua mente que sem um tratamento terapêutico, seria muito difícil desaparecer, assim, do nada”. Qual será o caminho para tratar as vítimas da violência doméstica? Pois na página 115: “Diminuindo sua autoestima, prejudicou bastante o seu pleno desenvolvimento...”.
            O livro, então, é a jornada de José para descobrir sua identidade, mas será que ele consegue? Assim, deixo a pergunta que nosso grande poeta Carlos Drummond de Andrade fez: “E... agora José?”
Margareth Sales