quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Crônica do facebook




Saiu no jornal: Dona de casa se mata por causa do Facebook. Maria, 30 anos, casada, dona de casa, consultava todos os dias o seu facebook, naquele dia entrou com mais fissura. Era seu aniversário! Não tinha vida fora da rede social, até tinha um bom marido, mas só! Arrumava casa, fazia o café da manhã, ansiosa para que o marido fosse para o trabalho e entraria na internet. Lá sim, se comunicava com todos ao mesmo tempo, nunca estava sozinha, pelo menos era como se sentia. Telefone? Visitas sociais? Para quê? O site tinha todas essas funcionalidades. Conversava todos os dias com todos os seus amigos, não eram muitos. Afinal estava chegando aos trinta. Se tivesse 15 anos, com certeza, com 15 teria um perfil lotado!

Naquele dia ao entrar no facebook, já eram umas 10 da manhã, seu marido tinha saído tarde para o emprego, pois queria curtir o aniversário com a mulherzinha. Mas as curtidas que ela buscava era o símbolo do polegar para cima, no facebook. Ao acessar a rede percebeu que tinha várias notificações de aniversário, mas nenhuma dos seus dois, únicos, amigos verdadeiros, estes que no passado frequentaram muito sua casa, mas que com o advento da web foram sendo realocados somente para o ciberespaço.

Maria não entendeu, uma dor profunda a invadiu: “Como assim não deixar uma postagem no meu face, não comentar meu status?” O que ela não poderia supor é que alguns conservam, mantém e alimentam vida social fora da rede.  Não entendeu que há pessoas que nem olham o facebook, só possuem um perfil, pro forma; outros que ao perceberem o tempo que o site ocupa em suas vidas reais, só deixam a atualização do feed de noticias para os que são, extremamente, amigos. Resumindo, existe um bom contingente de pessoas que não lêem o que está escrito nessa rede de relacionamentos, portanto nem tem noção daquilo que Maria postava e nem se sentiam culpados!

O marido de Maria a encontrou morta. Chocou-se. Depois lembrou que às vezes, para conseguir a atenção dela, ele tinha que mandar mensagem inbox. Sentiu alívio. Saía definitivamente da vida virtual, para uma muito melhor e mais curtida! Atualização de relacionamento: viúvo e totalmente online na vida fora da rede.
Margareth Sales

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Os modos da produção rocambolesca


Ai que vontade que dá


Continuando a escrever sobre a minha atual inserção na graduação de Letras, gostaria de falar sobre o que tenho estudado em Teoria Literária II e o que tenho aprendido nessas aula. A produção rocambulesca se refere a um tipo de folhetim, cujo personagem principal dá nome a esse tipo de narração, o Rocambole. O nome se refere, especificamente, ao rocambole que tal como o doce, é enrolado, portanto enrola o texto com peripécias e turbilhões emocionais.

E é o folhetim que estamos estudando nesse semestre. Tal gênero tem como característica marcante o melodrama e, por isso, foi considerado um gênero popular e pejorativo, subgênero. E, portanto, é do folhetim que surgem as novelas, chamadas hoje de folhetim eletrônico, o início do folhetim se deu através de fascículos escritos para o jornal, a história sempre era terminada com um suspense e retomada em seguida nos próximos fascículos. Essa característica prendia o leitor a compra dos jornais, procurando pelas respostas as brechas deixadas (as novelas não são assim?).

O exagero amplificador é uma das fórmulas do folhetim. No que se refere a amplificar o exagero, os temas precisam ser grandes e angustiantes: vidas em perigo; raptos; um grande e misterioso protetor desconhecido; perigos exagerados e os maldosos vilões. O texto, por vezes, acaba tornando-se confuso, pois deixa a desejar as possibilidades de desvendar os vários processos narrativos. Porém, isso também é parte da narrativa. E outro recurso nesse gênero é a pilhagem narrativa, ou seja, faz-se um recorta e cola de vários textos de renomados autores. Aumenta-se, desse modo, o delírio imaginativo da narração.

Particularmente, esse não é meu tipo de literatura, não o folhetim em si, muito menos o folhetim eletrônico. Mas seria exagero (e nesse caso, eu estaria sendo folhetinesca) chamar de subgênero. É verdade que o folhetim tem seu lugar. É verdade, que todo tipo de literatura é bem-vinda, porque cada uma delas vai se coadunar com um tipo de pessoa e se não somos iguais, subjetivamente, também não precisamos gostar das mesmas coisas ou, no caso aqui, leituras.

É a diversidade que melhora a vida, são essas diferenças que se acrescentam ao nosso modo de viver que faz da vida um lugar plural, portanto, mais gostoso. Além disso, como tudo tem o seu espaço e sua razão de ser, acaba que os modos de produção rocambolesca se desdobram e trazem um tipo de literatura que sempre achei excelente: a crônica! E ainda tenho que acrescentar, a escrita louca me chama atenção, ou seja, a escrita que brinca com a escrita, que vem, desfaz e refaz, como um rocambole, não especificamente o folhetim com o melodrama, mas a paródia, encharcada de humor!
Margareth Sales

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

A revolta dos objetos

Continuando na "vibe" da Literatura, por estar em Letras, mais uma Literatura infantil. Breve publico essa coletânea que estou fazendo das minhas histórias infantis. A ilustração é minha!

Certo dia o despertador estava passeando quando encontrou seu velho amigo o perfume. Depois de muita conversa o despertador disse que estava muito triste.
- Mas por quê? Perguntou o perfume.
E o despertador contou que foi despedido porque atrasou um minuto.
- Isso não pode acontecer - falou o perfume.- Uma vez meu chefe queria fazer isso comigo. 
Ele não tinha tomado banho e me passou, ficou com raiva só porque ficou fedorento. Eu tenho culpa de ele não tomar banho?
- Os homens são muito engraçados - interrompeu o despertador - fazem as coisas erradas e não reconhecem, por isso nos colocam a culpa.
- Sabe o que poderíamos fazer? - Sugeriu o perfume. - Uma greve.
- É ótima ideia.
E foram falar com todos os objetos: o ventilador, a tesoura, a televisão e muitos outros. Eles concordaram logo com a ideia.
- Temos que fazer isso mesmo - falou o ventilador - nós não somos lixo e eles tem que aprender isso. Uma vez meu dono estava com raiva só porque brigou com a namorada e me jogou no chão. Eu tenho culpa de ele ter brigado com a namorada? Eles tem que aprender a respeitar nossos direitos, afinal eles precisam de nós.
E a greve durou muitos dias, até que os homens perceberam que não poderiam viver sem os objetos e resolveram aceitar o que os objetos queriam.
Foi assim que os homens aprenderam a ter mais carinho com os objetos, não só com os objetos, mas também com a natureza e tudo que cerca o homem.
Se existe alguma coisa ao nosso redor, provavelmente não está ali à toa. Se aquela coisa desaparecer sentiremos sua falta, por isso devemos cuidar com muito carinho das coisas, para que a tenhamos sempre.

Margareth Sales

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Análise do texto dramatúrgico Medéia através da Poética Aristotélica e a evolução do gênero feminino considerados pelo viés psicanalítico da histeria freudiana



Texto feito para avaliação de Teoria Literária 1, modificado e acrescentado para o blog.

O gênero da peça de Eurípedes, Medéia, é dramático e drama no grego significa ação. Sendo essa peça, antes de tudo, um texto escrito, é híbrido quando mistura escrita para teatro e obra literária, podendo ser lida ao invés de vista; assim, pode-se escolher entre ler a obra impressa ou assistir. O texto dramatúrgico apresenta plurimidialidade, pois trabalha com duas ou mais mídias, demonstrando a natureza híbrida que há entre texto e encenação. O leitor, de início sente estranheza, ao ler um texto que foi feito para os palcos, mas supera-a pela natureza estética dessa criação literária, pois o texto provoca reflexões.

Para Aristóleles, o gênero dramático é representado de três formas: pelo meio, que diz respeito à língua e a música; pelo modo, que é a forma como a peça será encenada; e pelo objeto, feito a partir da ação e dos personagens. Além disso, o filósofo apresenta a regra das três unidades: o tempo e o espaço devendo ser realizado na duração de um dia e em mesmo local; e a ação impreterivelmente com começo, meio e fim. Essas didascálias Aristotélicas primavam por um modelo grego de realização artística. Hoje se reconhece que o método imobiliza a investigação, tornando-se apenas reprodutor de conceitos, ou seja, as possibilidades de criação e recriação são maiores!

Em Medéia pode-se analisar o gênero dramático através da nomenclatura de Aristóteles, como: a peripécia, o reconhecimento e o patético, quando Medéia promete que não fará nenhum mal a Jasão e a sua noiva e ocorre a reviravolta das ações, em que a protagonista mata a noiva e o pai da noiva. Logo depois acontece o reconhecimento, no caso do texto de Eurípedes ver em Medeia a força de sua ira e tem-se a consciência de que foi ela que praticou a ação da peripécia. Finalmente, o patético, que é a ação que produz a destruição e o sofrimento: no texto de Eurípedes, é a morte dos filhos de Jasão que causa dores cruciantes.

Ainda nessa linha de raciocínio, Medéia ocorre dentro da regra das três unidades de Aristóteles. Isto é, a duração do texto foi de um dia, em que Creontes expulsa Medeia de Corinto e tudo acontece no mesmo local: a casa da protagonista. Desenvolvendo na trama um começo, quando a ama conta da tragédia que se abateu sobre a personagem; o meio, a decisão de Creontes de expulsar a esposa de Jasão da cidade; e o fim, a subida no carro de sol com os filhos mortos.

A hybris, ou, situação que sai do controle no texto, torna-se desmedida, provocando a vingança que, para Aristóteles, não atinge o fim pedagógico da peça, para o filósofo a catarse seria a punição de Medéia. A ausência de punição para com a personagem é a nemesis, lembrando que tal nemesis ocorre quando da interferência de um deus ex-machina fazendo com que a hamartia, que é a falha trágica, ficasse sem punição, pois outra ação não esperada se interpôs e a personagem subiu em um carro do sol com o corpo de seus dois filhos.

Esse tipo de atitude feminina ainda existe nos dias de hoje e com características fortíssimas da histeria freudiana, mas que segundo o compêndio psiquiátrico DSM-IV não existe mais na contemporaneidade. No entanto, em pesquisas percebe-se que a histeria não acabou, sendo uma manifestação de uma cultura, evoluindo para o comportamento boderline. Medéia era limítrofe, ia até o fim por suas obsessões (e o fim foi a morte dos próprios filhos). Estava presa a um código de ética, da época, onde toda a sua ajuda a Jasão seria retribuída pelo casamento e jamais a dissolução desse!

Personagens mais modernas como a Emma Bovary (Madame Bovary do Gustave Flaubert) também apresentava essas características histéricas, essa personagem muito mais do que Medéia mostra a força com que se priva uma mulher de seu verdadeiro eu. Emma Bovary era um misto de mulher de sua época com todos os nãos que tentava embotar seus verdadeiros desejos e a mulher mais contemporânea que faz os desejos serem realizados. Essa mulher tão bem descrita no livro 'O segundo sexo' de Simone de Beauvoir que perde parte de si em função de uma cultura que a prende dentro de um matrimônio. O caminho do gênero feminino para aquelas mais questionadoras não poderia deixar de ser a histeria, pois trabalhando com o não que a cultura transmite e o desejo, as moças acabam por se fazerem cindidas.

Nessa linha, apresento a minha personagem, de meu novo romance: a Beatriz do 'Entre Modernos Mal-estares' que não é punida com a morte, nem precisou matar filho nenhum. Mas que ainda luta com a hipocrisia moderna em torno da figura da mulher, a mesma mulher que Beauvoir cita, a “boazinha”, feita para o sacro-santo caminho do matrimônio. Por isso, ainda na linha do mal-estar da civilização do Freud e o Mal-Estar da pós modernidade do Bauman, luta com esteriótipos de uma época que só fazem adoecer a condição humana e, principalmente, ainda a condição feminina, prendendo-a em pré-conceitos que lembra a Woman in chains do Tears for fears e não a deixam completar, viver a sua verdadeira vocação: ser mulher sem as imposições de uma característica cultural de gênero!
Margareth Sales

REFERÊNCIAS:

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION – DSM-IV-TR. Manual Diagnósticos e Estatístico de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2002.

ARISTÓTELES. A Poética Clássica. São Paulo: Cultrix, 1990.

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998.

BEAUVOIR, Simone. O sexto sexo: 2. Fatos e Mitos. São Paulo: Círculo do Livro, 1986.

EURÍPEDES. Medéia. Lisboa: Inquérito, 1973.

FLAUBERT, Gustave. Madame Bovary. Paris: Librairie Generale Française, 1978.

FREUD, Sigmund. O mal estar na civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997.

SALES, Margareth. Entre modernos mal-estares. Rio de Janeiro, 2012. Nº de Registro: 567.398, Livro: 1.082, Folha: 463
 

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O verbo




Devo admitir que nunca me preocupei muito com o verbo. Essa história de fazer perguntas para ele me parece muito íntimo, sempre quis é usar o verbo com tudo o que ele poderia me oferecer. Sem me preocupar com as ações que ele pratica, ele tinha, somente, que me servir.

Nunca pedi o telefone do verbo, depois que o usava. Sempre usava o verbo sem ter nenhum respeito por ele, nenhuma emoção. Para mim o que estava contando era a diversão: EU ME DIVERTIA! Nem passava pela minha cabeça que o verbo queria estabelecer uma comunicação comigo, que ele queria que eu soubesse quem era o seu sujeito, qual a ação que praticava e para quem praticava essa ação ou o que essa ação interna desdobrava.

Nunca imaginei que o verbo tinha argumentos internos que o acompanhavam e dependendo do verbo eram um ou mais argumentos. Quer dizer que o verbo queria se comunicar comigo e eu só queria uma boa noite de prazer, usar o verbo indiscriminadamente sem me preocupar com toda sua lógica interna, só diversão, sem compromisso e sem seriedade.

É muito bom quando somos adultos o suficiente para encarar as próprias questões: eu precisava ouvir o verbo, entender o seu objeto, mesmo que fosse direta ou indiretamente. Não podia mais deixar que o verbo fosse como o Latim, indecifrável para mim, precisava entender esse latim e passar a amar o verbo. Não poderia mais deixar o verbo ser um objeto zero na minha vida, tinha que deixar ele me mostrar sua inferência, tudo o que estava implicado em seu objeto.

Mesmo que em determinados momentos o que ele queria falar era tão complicado que, às vezes, poderia chamar de teoria X-Barra. Mas era mister deixá-lo apresentar seus argumentos internos.

Esse foi meu grande insight; o que me tirou do meu mundinho abusador de verbos indefesos. Como sujeito eu precisava estabelecer uma relação de concordância com o verbo. Apostei nesse desafio mental, a partir do momento que percebi que o verbo tinha muita ação e reflexão para me oferecer. Alguns abrem o verbo, eu decidi desvendar o verbo para meu crescimento pessoal!
Margareth Sales