domingo, 6 de fevereiro de 2011

Vestígios do passado


Saímos de misticismo e entramos há muito tempo atrás no pensamento filosófico-científico. Isso para que os fenômenos de processos naturais fossem explicados de uma maneira mais embasada no conhecimento da verdade e no racionalismo.

Mas mesmo assim, mesmo depois de todo os séculos de conhecimento ainda somos atormentados por fantasmas. E como poderíamos nos livrar desse vestigio do passado? Porque um único erro que cometemos é imputado como conduta desviante e prova por vezes, inquestionável, de que toda causa produz um efeito. Se em todo esse tempo de existência do planeta Terra não pôde ser provado que uma ruptura poderia acontecer entre o fenômeno 1 e seu consequente efeito, o fenômeno 2. Então, como poderíamos crer que a mesma ruptura poderia acontecer dentro do terreno comportamental.

Essa premissa acaba por criar um efeito assustador no homem porque determina que os vestígios do passado poderão surgir a qualquer momento. Como um fantasma não exorcizado e não liberado, causando uma espécie de tensão emocional no campo psíquico e espiritual.

Haja vista, que para a liberação desse fantasma é necessário acordo entre as duas partes: a parte humana e a parte fantasmagórica, ou seja, aquele vestígio do passado, aquele amuleto interno que guardamos e não deixamos, de verdade, o outro lado ir. Às vezes libertar-se dos fantasmas transforma-se em um local assustador, por isso não queremos passar perto e nem voltar para o local onde os fantasmas poderão ser vistos. É lugar comum termos o conhecimento de que fantasmas só permanecem onde existem negócios não-resolvidos.

Mas alguém tem que encarar, alguém precisará estar frente a frente com os próprios fantasmas, para que possa se libertar e libertar o outro que em algum lugar tenta respirar. E só quer isso! Há uma teoria que diz que o quase é pior do que o fracasso porque quase leva um sentimento de remoer detalhes daquilo que deu errado e remoer estende qualquer sentimento para além do tempo que seria necessário para seu encerramento.

Então esse quase, ou seja, esse vestígio do passado o qual nos apegamos. Esse fantasma que não exorcizamos tem o poder brutal de prender nossa vida e torná-la um inferno do nível de Dante. Porque acorrentamos as pessoas a nós mesmos? Como se fóssemos, diariamente, ao local onde podemos amarrar o nome daquela pessoa na boca de um sapo ou mesmo uma encruzilhada para garantirmos que aquela pessoa não irá embora. Porque não libertar? Libertar-se dos fantasmas do passado é uma atitude profunda e forte. E muitas vezes não liberamos porque esperamos da outra pessoa que pague tudo o que nos deve e a dívida começa a avolumar-se e quando vemos impossível é que se pague. Um pequeno erro, conduz ao erro médio que conduz a um erro maior e a bola de neve está formada! Não há como parar mais!

Deixar o outro ir é estancar com a bola de neve é parar de pedir o melhor comportamento do outro numa atitude de sujeição para com o próximo. Porque levar até o fim é um termo falacioso para segurar o que não se consegue deixar ir. Sei que ninguém deixa ir para se sentir nobre, ninguém quer se sentir nobre, queremos é mais comer o prato da vingança frio mesmo. Mas quem é que paga a conta? Nós! Se não deixarmos ir, somos nós mesmos acorrentados pelos nossos próprios fantasmas e aí de nós ao dormirmos toda noite acorrentados.

Retirar o olhar assustador de sobre as pessoas, sobre aqueles que passaram por nós mas que não quiseram ou não puderam ficar! Pode-se vigiar, mas não se pode ter mais e qual seria o sentido então? Montar guardar, não deixar ir, construir barreiras psicológicas quando não se tem o objeto de desejo, não se toca mais, viramos Ghost, presos entre dois mundos: o mundo real que deseja e o mundo irreal que não toca mais. Nos tornamos, dessa forma, seres lamentavelmente mortos por dentro e seguindo a trajetória de Dante, imersos no inferno.

Olhar, pode ser mais uma coisa assustadora, pois também é conhecimento de todos que o mal olhar seca até a pimenteira. Para andar na contramão do mal olhado é preciso começar a ver as pessoas, entender-lhes. Porque quando olhamos somente para a nossa necessidade de preenchimento de vazios e colocamos o outro nessa posição tapa buraco do que eu não posso ainda enxergar, acorrentamos mais um fantasma que irá nos assombrar diariamente... 

Romper com a causalidade do efeito dominó do aprisionamento humano. Estancar com a vingança. Perdoar o erro, grande ou pequeno, para liberar a causa de seu consequente efeito, ou seja, se toda ação tem uma consequência, cessar a ação e extinguir a consequência. Como diz a filosofia é preciso se apropriar da noção do époche, isto é, suspender o juízo. Suspender o juízo leva-nos a ataraxia, ainda segundo a filosofia a palavra representa tranquilidade. Libertar o outro é libertar a si mesmo, é suspender o juízo e apropriar-se da tranquilidade!
Margareth Sales

5 comentários:

  1. Gostei! Texto profundo, tratando o tema perdão de uma forma nova!
    Inovador como sempre!

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  2. Lindo e inteligente como sempre.
    Parabens!

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  3. Olá
    Apesar de um pouco confuso e de eu me perder em algumas partes do mesmo, achei que o texto em si muito bom...
    Não por achar que eu esteja preso ha algum fantasma do passado, é mais coisa p/ a escritora mesmo, mas pelo menus leva a gente a refletir sobre ocasioes não resolvidas ainda no presente...
    Parabens pelo texto...

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  4. Muito bom o texto... hj mesmo tive mais um momento de expulsão fantasmas da minha vida e ainda tem mais correntes para serem arrancadas...aff!
    Higor

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  5. Será que conseguimos nos libertar dessas correntes, será que nosso coração nos libertará de tudo o que vivemos? Será que realmente queremos isso?
    O que eu prefiro, pagar a conta? Ou o prato da vingança?

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