Vamos falar dessa máxima, antiga, redutora e arcaica de que alguns não
trabalham... Passei minha maturidade, criando um perfil trabalhista para mim, a
primeira razão: meu primeiro emprego fixo foi no CIEP, com crianças, no meio de
uma depressão intensa, sem medicação, sem saber que, aliado a depressão, eu
tinha Transtorno de Ansiedade Generalizada. Eu acordava 6 horas da manhã para
estar no CIEP às 8 e eu sou noturna (isso é um perfil biológico - já tive
médico me empurrando remédio goela à baixo para eu conseguir acordar cedo, não
adiantou só piorou meu quadro clínico). Eu chegava no Ciep, antes de pegar os
alunos na fila, e ia para o banheiro chorar. Eu chorava em sala de aula, eu não
sabia fazer os alunos me respeitarem, como? Desiquilibrada do jeito que estava.
Eu vivia angustiada, com dor emocional e não conseguia nem ficar acordada para
ter lazer com o dinheiro fixo que ganhava. Esse dinheiro não dava para nada,
obviamente que com salário fixo, eu poderia ter saído de casa, mas não havia
como eu entender que essa possibilidade existia, pois a dor era maior do que o
raciocínio lógico. Tentei através de psiquiatra, fornecido pelo estado, me
encostar, claro que eu era muito nova (23 anos), mas qualquer profissional
competente saberia que não tinha condições laborais, mas não, o idiota disse
que eu estava bem! Eu era suicida (bem, pelo que sei para quem tem esse perfil
não existe cura, nunca li, nunca aprendi com os profissionais da área de saúde
mental que há cura!) como eu estava bem? Eu chorava com meus amigos da
vizinhança, eu chorava 24 horas, eu sentia dor emocional, eu sentia medo da
vida, eu já tive ocasiões de pedir as pessoas que me levassem até o ponto do
ônibus, pois tinha medo de ir até lá, sentindo que um buraco se abria à minha
frente e me devorava! Eu passei quase 50 anos com medo da minha mãe, do meu
irmão, do meu pai, de alguns primos evangélicos...
Eu estou falando sobre trabalho ou sobre Setembro Amarelo? Os dois? O
pior do sentimento de depressão aliado à ansiedade é não conseguir deter o
corpo! Sabe aquelas cenas brutais de corpo caindo no chão depois de uma
experiência de trauma? Sim, é assim que pessoas com dores emocionais se sentem.
O corpo não contém, o corpo parece querer explodir, alguns depressivos
conseguem ficar na cama e não sair dela mais... Não era o meu caso, meu corpo
se agitava. Eu precisava andar. Disse para um amigo, uma vez: eu quero andar
sem parar e não voltar mais, meio Forrest Gump. Eu não conseguia ficar em casa,
me tornei evangélica para fugir de casa, para estar na igreja, para que Cristo
matasse meus demônios emocionais (não adiantou, diziam que era falta de fé!
Remeto a assertiva à cena da Carrie Bradshow defendendo a Charlote numa
palestra motivacional dizendo que sim ela tinha fé), assim afirmo que sou uma pessoa
de fé e que se fosse por fé, eu tinha me curado, com certeza!
A fé não me curou, a arte não me curou, tanto como não curou a Clarice,
não posso defender isso na minha dissertação, mas no meu facebook posso falar
achismos. Portanto, a arte nunca curou o artista: VanGogh, Kafka, Virgínia
Woolf e tantos outros, Vivienne Haigh-Wood, primeira esposa de T.S.Eliot foi
tratada como louca porque possuía um distúrbio menstrual intenso, ou seja, a
ciência tem avançado no conhecimento das doenças psíquicas e deixando para trás
o estigma de loucura. Com a arte fui, aos poucos, aprendendo a trabalhar meu
humor e criar para me sentir melhor, emocionalmente. Nesse sentido, foi só
durante a década de 90, depois de largar o estado, passar pelo shopping, como
vendedora, comprar meu primeiro computador em 1995, sem emprego fixo, que
passei a trabalhar em casa das mais variadas formas possíveis como autônoma. No
passado, algumas vezes ajudando meu irmão na gráfica, no qual ele recebia, era
independente e eu só a mulher que tem que ajudar a família, mas sem ganhos! Meu
pai me ensinou a imprimir na máquina manual e na gigantona, aquela anterior a
offset, mas possivelmente porque não iriam me pagar para eu trabalhar eu não
fui à frente, nunca aprendi a montar os tipos para fazer a chapa, me sentia
burra, achava que não conseguiria. A gráfica passou do meu pai para meu irmão,
ele ficou com o dinheiro e eu era estigmatizada de vagabunda, pois só estudava!
Havia uma possibilidade, eu ir à rua pegar clientes, como fez meu irmão
a partir dos 9 anos de idade. Nesse sentido, o irmão mal, também precisa ser
exaltado, pois tem suas qualidades, enfrentou a vida a partir dos 9 e sempre
foi vitorioso, até mesmo no casamento que muitos fracassam, ele têm uma família
linda! Porque não ia a rua procurar clientes? Simples (sarcasmo)! Fui ensinada
que era burra em matemática e tinha medo de fazer os cálculos de cobrança!
Porque então aos 48 anos de idade eu aprendi a fazer tais cálculos e se você me
pedir um banner de 1m por 22cm eu sei fazer o cálculo? Porque mesmo sendo de
letras, nunca fui burra em matemática, somente aceitava o que diziam que eu
era, identidades roubadas! E o resultado foi pela primeira vez entender que
estava começando a fazer dinheiro em gráfica, como minha família de muitos gráficos
e por isso voltei a ter crédito na praça e comecei a reformar, comprar e veio a
pandemia... Começo, primeiros passos, primeiros clientes, Bankruptcy!!!
Nesse sentido, meu trabalho sempre foi criação, sempre foi arte e não
tem como dizer que porque não vou a rua procurar clientes em um momento
pandêmico não trabalho. Se não trabalhasse, voltaria para o quadro clínico que
me remete a depressão. Insisto que em 98% da minha vida diária não sinto
depressão, me sinto perfeitamente adaptada ao isolamento social, não surtei,
entendo que a maioria surtou. Não é meu caso, mas sim continuo sentindo ansiedade
intensa, mas sei trabalhar com ela e Pânico, brutal, desconcertante e me acorda
em darkness profunda que se dissipa
em função do trabalho diário, ao sentar no computador volto a me sentir bem.
Não me sinto sozinha, mas quando converso com amigo, vejo a necessidade de
gente e desato a falar feito papagaio.
Concluindo... o que levou para longe a angustia depressiva? O tratamento
no Centro de Orientação a Mulher (CEOM) aqui da cidade e fui encaminhada em uma
entrevista de emprego (2015) para pedagoga, pois quando ela perguntou para mim
quais as minhas qualidades, desabei a chorar! NUMA ENTREVISTA DE EMPREGO?! Alôooo!!!
E a Marisa disse: "você é vítima de violência familiar" vou te
encaminhar para o CEOM e eu respondi que tinha aula na UERJ, não podia faltar
(não falto aula), ela não "deixou", disse que eu não poderia ir
estudar sem conversar no CEOM, ligou, a prefeitura daqui mandou um carro me
buscar e me levar ao CEOM. Entrei em um tratamento com assistente social,
advogado, psicólogo, além da sexta básica para quem está em vulnerabilidade
financeira. Já no começo do trabalho, a depressão foi a primeira a dar tchau...
Ao longo do tempo e por uma leitura de mundo atenta (Ah! Paulo Freire, te amo),
coloquei para o meu psicólogo que achava que tinha TAG e procurei um
psiquiátrica. Não deu outra, entrei na medicação e descobri no Ambulatório Nize
da Silveira um grupo chamado loucos pela vida. O que seria isso? Um grupo de
apoio para suicidas e aí eu finalizo com Setembro Amarelo: "Não me
perguntes por quem os sinos dobram, eles dobram por ti!" - John Donne.
Cada vida é especial, os suicidas não estão com fogo no rabo, muitas vezes não
entendem quando você fala que passou pelo mesmo e deu conta, pois possivelmente
eles só darão conta com terapia + medicação. Suicidas não ficam bem quando são
ameaçados de mármore do inferno, mas o inferno não é quente? O inferno não está
destinado aos suicidas e que me desculpem os amigos evangélicos se vierem
postar assertivas de fé tresloucada, pois serão apagados! A fé não salva suicidas,
a força de vontade não salva suicidas, como não salva alcoólicos, quem trata
alcoolismo só o AA e suas divisões. Empatia ajuda, mas não trata. Nos meus 49
anos só conheci duas músicas que esclareciam perfeitamente o suicídio e quem
fica e as duas são de Pitty: Pulsos e Lado de lá e elas não deprimem! Me ajudam
no momento que me sinto suicida e só me sinto suicida, atualmente, quando a má
política tira direitos essenciais! A música pulsos fala para guardar as linhas
horizontais e tentar achar que é todo mal, exercitando a paciência, mas ao
dizer que os pulsos são a saída de emergência, a música livra do peso de achar
que é um erro o suicídio! Para o suicida o suicídio não é um erro, mas uma
saída! E não sei dos outros, sei de mim que quando a dor era atroz, lá atrás,
eu imaginava um outro mundo em que não doesse tanto! Mas quem vai dar o salto?
Quem vai descobrir se é ou não? Kurt Cobain não voltou para contar, nem
Virginía Woolf, muito menos Walter Benjamin! E a música Lado de lá, confirma a
assertiva de que há dúvidas sobre o lado de lá, ao mesmo tempo em que "e
levou de mim aquele talvez rir de tudo no fim", ou seja, foi brutal ao
tirar da pessoa do lado de cá o convívio, o amor, mas quem está do lado da vida
tem a esperança em rir de tudo no fim... Nesse Setembro Amarelo para ajudar o
suicida deixe o telefone/messenger/whastsapp aberto para ele, ouça sem julgar,
não minimize a dor do outro, não se compare, pois somos infinitamente diferente
de outros. Não dê conselhos, só quem está habilitado a dar feedback são os
profissionais de saúde mental, até os profissionais de saúde física precisam
encaminhar se sentirem que o paciente pretende adiantar a viagem para o lado de
lá!
Margareth Sales